Trabalho de Manuel Ferreira da Silva, historiador, fundador do jornal Voz das Misericórdias e autor de diversos livros sobre as Santas Casas, cuja reprodução é gentilmente autorizada pela União das Misericórdias Portuguesas, a quem agradecemos na pessoa do seu Presidente o Dr. Manuel de Lemos.

 

1 - O que é uma Misericórdia?

Uma Irmandade (associação ou congregação) de leigos, animados pela mesma fé e unidos pelos mesmos objectivos de testemunharem em colegialidade uma caridade fraternalista, constituindo uma presença e uma força de esperança junto de todos os que precisam. 

2 - Quem é Irmão da Misericórdia?

Todo aquele que, vivendo e testemunhando por ideias, palavras, obras e modos de comportamento, uma evangélica vocação de voluntariado generoso de fraternidade, se propõe, de acordo com as normas históricas do compromisso, prestar um serviço de ajuda e atendimento, mas ao jeito do Bom Samaritano.

3 - Como se define e expressa a vocação especifica de um Irmão da Misericórdia?

Sentindo-se, tal como Jesus Cristo o disse e protagonizou, mais próximo de quem precisa de ajuda, sem exigir condições nem pedir contrapartidas de qualquer ordem, tendo apenas em conta o bem que presta, e nunca as vantagens de que possa pessoalmente beneficiar.

4 - Que significa "misericórdia"?

Conforme o expressa a própria palavra na sua decomposição literal "Miseris + cor + dare" ou seja: Ter lugar no coração para todos os que são vitimas de qualquer forma de miséria. Ou "dar o coração aos miseráveis vítimas de qualquer miséria", sem discriminação alguma nem exclusão de qualquer natureza.

5 - O que são as 14 obras de misericórdia?

- Dar de comer a quem tem fome;

- Dar de beber a quem tem sede;

- Vestir os nus;

- Acolher os errantes;

- Visitar os doentes;

- Remir os cativos;

- Sepultar os mortos.

Estas as obras de misericórdia ditas corporais. As espirituais são:

- Dar bom conselho a quem pede;

- Ensinar os ignorantes;

- Corrigir os que erram;

- Consolar os que estão tristes;

- Perdoar as injúrias;

- Suportar com paciência as fraquezas do nosso próximo;

- Rogar a Deus pelos vivos e pelos defuntos;


6 - Quem deve ser considerado o nosso próximo?

Todo aquele de quem cada um mais se aproximar; e não tanto aquele que mais simpatia ou afinidade, étnica, cultural, social, religiosa, política ou outra, possa ter connosco. Para a caridade não há fronteiras de qualquer natureza. Para quem ama não há distâncias, nem discriminações, nem condições. O bem faz-se só porque é bem, pois o bem que fazemos também deve melhorar aquele que o faz. 

7 - Quando começou o movimento das Misericórdias?

Em bom rigor Histórico, deve dizer-se que foi com o próprio Jesus Cristo quando no evangelho diz: "Bem aventurados os misericordiosos, porque hão-de alcançar a Misericórdia". (MT. V, 7: Lc. VI, 36). Mas como movimento organizado em Irmandade ou Confraria, ele está bem patente já nas primeiras comunidades cristãs, das quais se diz que os irmãos "estavam todos unidos num só coração" e "numa só alma". (Act. IV,32:E), assim, instituíram os "serviços das Mesas" para atendimento dos mais carenciados, criando um corpo de "diáconos". Ao longo dos tempos ele tomaria uma forma de mais definida organização, designando-se mesmo por "Confraria" ou "Irmandade", em 1244, na cidade de Florença, com o providencial impulso de S. Pedro, Mártir, da ordem dos pregadores.

8 - O que motivou a criação das Confrarias de Misericórdia?

As constantes guerras de grupos, classes, cidades e forças políticas e outras organizações de luta e ambição, já na alta Idade Média, que fizeram dos caminhos campos de batalha, motivando assim alguns cristãos mais generosos a meterem-se de permeio, como "avindores", ou seja, congraçando os desavindos e gritando "Piedade! Piedade!" "Misericórdia! Misericórdia!", de mãos estendidas, juntas, ou de braços abertos, ficando designados por "mãoposteiros".

9 - Por quem foram criadas as Misericórdias?

Somente por leigos que se constituíam em grupos interventores, ficando, todavia a merecer, da parte da Igreja as melhores bênções e apoios. São, portanto, as Misericórdias uma instituição genuinamente laical; ou seja: de Leigos cristãos, mas não de cariz laico. São, por isso, o grande movimento de mobilização de leigos que mais tradição criou e atravessou os tempos, sem nunca se desactualizar.

10 - Como se expandiram as Misericórdias?

Abrandadas as guerras, e intensificando-se com o aparecimento de ordens religiosas, dos mais diversos carismas, as pregações e outras muitas formas de missão, surgiu a época das grandes Peregrinações e Cruzadas junto de Lugares Santos: Jerusalém, Roma, Santiago de Compostela, além de outras a muitos Santuários como Colónia, Chartres, Rocamador etc. Motivando-se com isso inúmeras formas de assistência aos peregrinos com a instituição de albergarias, hospitais, leprosarias, e outras muitas formas de acolhimento e apoio, assistência e solidariedade, transpirantes do melhor Humanismo Cristão, mobilizando-se no melhor espírito de "cruzada" e de caridade na prática de acções de bem-fazer, concretizadas e equacionadas segundo as 14 obras de Misericórdia.

11 - Qual o tempo histórico exacto da instituição oficial das Misericórdias em Portugal?

Precisamente em 15 de Agosto de 1498, e na capela de Nossa Senhora da Piedade (da terra solta), retomando-se uma já muito devota e antiga tradição portuguesa, e dando-lhe novas formas e programas de acção, num compromisso equacionado segundo todas as 14 obras de Misericórdia, o que as tornou classicamente originais e mais abrangentes do que todas as anteriores. 

12 - A quem se deve a  instituição das nossas Misericórdias?

Ao generoso empreendimento da Rainha D. Leonor de Lencastre, viúva do rei D. João II, sendo seu grande conselheiro e protector em Roma, o Cardeal D. Jorge da Costa (Alpedrinha) já muito ligado à família real portuguesa desde D. Afonso V e eminente figura de prestigio junto do Vaticano.Mais perto da Rainha, poderá ter sido o frade Trinitário Frei Miguel Contreiras, seu confessor, e grande apóstolo dos pobres e dos marginalizados nas ruas de Lisboa. Por deferência de muito significado, e por gesto de humildade pessoal, não quis a Rainha figurar nas bandeiras como instituidora ; mas consignou na escritura da fundação que ela lhe deu: "permisso, consentimento e mandado" tal como o colégio da Sé onde se instituiu lhe deu "ortorga, autoridade e ajuda". Ficariam assim as Misericórdias como obra de "Homens Bons", que a Corte apoiava, e que a Igreja abençoava, mas respeitando, uma e outra, a necessária autonomia". Assim pode dizer-se que, de futuro, as Santas Casas, como o povo agradecido a havia de canonizar, formariam com a autoridade civil e a hierarquia eclesiástica uma trilogia de intenções, de formas e de projectos convergentes , e no melhor espirito de parceirismo em prol da comunidade, e que se poderá equacionar em: Município, Matriz e Misericórdia.  

13 - Qual a diferença específica entre as Misericórdias ditas de Florença, ou de S. Pedro, mártir, e as da Rainha D. Leonor?

É que, enquanto a de Florença, como, aliás, também as tradicionais Confrarias, tinham o seu "compromisso" - "estatuto" - equacionado apenas à base das 7 obras de misericórdia corporais, as de D. Leonor programaram o seu Compromisso segundo a letra e o espírito das 14 obras de misericórdia, o que lhes deu a abrangência de uma programática assistencial de cariz universal, mais abrangente e globalizante, porque atendia ao homem todo - corpo e alma - e a todos os homens, sem qualquer discriminação, ou seja: equivalente a uma verdadeira revolução assistencial no Reino e para a época de então, e lhes garantiu um carisma único de sobrevivência e perpétua actualidade.

14 - Qual é a lei fundamental das Misericórdias?

As Misericórdias, como instituição organizada de cidadãos mobilizados em voluntariado de fraternidade associativa - por disposição espontânea ou por convite - só têm uma lei especificamente evangélica: a caridade, objectivamente concretizada nas palavras de Jesus Cristo: "amai-vos uns aos outros como irmãos" (Jo. XIII,34), retomadas por S. João: "de tal modo Deus nos amou, que nós devemos amar-nos uns aos outros" (I Jo.IV,41).   

15 - Como são as obras de misericórdia expressão e testemunho dessa lei?

Definindo-se a caridade como a virtude e graça de amar a Deus sobre todas as coisas, porque só por ele nos sentimos verdadeiramente amados; e, tornando-se lei da Nova Aliança, ela implica, como seu complemento directo, a prática de "amarmos todo o próximo como a nós mesmos" E nisto se sintetizam e conformam" a Lei e os Profetas (MT. VIII,12).  

16 - Será que o número 14 das obras de misericórdia, tão antigas como o Evangelho, ainda se podem equacionar segundo as exigências e carências sociais de cada época?

Consistindo a caridade na virtude de "Amar a Deus e ao próximo", só o seu carisma divino deve estar em foco, sem quaisquer outras segundas intenções, acomodando-se, no entanto, a todas as formas concretas de que o amor se há-de revestir, para se expressar com todo o sentido de premência e actualidade, segundo as exigências e necessidades de cada comunidade, as carências de cada território, frente aos desafios de cada tempo, procurando ser, segundo a linguagem de cada época, uma resposta pontual e pronta, frente às emergências mais exigentes, com serviços sociais de obras concretas e permanentes, que se imponham pelo seu poder de intervenção rápida e pelo seu sentido de expressão convicta e convincente de humaníssima e cristã solidariedade; e até como exercício generoso do melhor direito de cidadania interveniente.  

17 - Qual o cariz globalizante das obras de misericórdia?

De duplo significado e valor, assim:
1. Sendo 7 obras de misericórdias corporais, e 7 obras de misericórdia espirituais, elas abrangem o Homem todo, em corpo e espírito;
2. Estando o seu enunciado equacionado para todo o sempre, e conforme o espírito universalista do Evangelho mandado anunciar a todos os homens, a todos os povos, e em todo o mundo, elas abrangem a universalidade da humanidade, sem qualquer sombra de discriminação.
3. Permitindo a sua interpretação equacionar-se segundo as sempre novas carências de cada tempo e cada povo, elas abrangem os séculos todos e todas as situações de carência, conforme o tipo de fome, de sede, ignorância ou carência de que se sofra, e que em cada época tomam cariz diferente.
4. Sendo assim, elas são a síntese da mais universal abrangência que se poderia ter equacionado no sector existencial da solidariedade, nunca perdendo actualidade nem lhes faltando oportunidade.   

18 - Será que o número 14 tem algum simbolismo, ou é uma unidade meramente taxativa, limitativa da generosidade?

Sendo o total de 2 x 7 (duas vezes sete), o número 14 que equaciona as obras de misericórdia é um número profundamente simbólico, já que o número 7, tanto na interpretação bíblica como na mitológica, é símbolo da totalidade, da completude, do "sempre mais", "mais longe", "mais alto" e "mais perfeito". Segundo o dizer de João Paulo II, será o número que significa "inventar cada dia os meios que melhor podem servir os irmãos... até ao extremo do amor. Pois é o serviço para com os outros que transforma a existência". (Na Jornada Mundial da Juventude em Paris, Verão de 1997).  

19 - O que é o Compromisso da Irmandade da Misericórdia?

È o texto fundamental e estatutário de todo um corpo de doutrina, organização, comportamento, mordomias e actividades, bem como calendário de celebrações e acções a desenvolver, tendo em vista 2 objectivos muito específicos e entre si complementares:

  • O culto de Jesus Cristo e da Senhora da Misericórdia;
  • E a prática organizada e disciplinada das 14 obras de misericórdia segundo uma certa premência de valores e de urgências em prol dos mais carentes;

 

20 - Um Compromisso não será o mesmo que um Estatuto?

A palavra estatuto introduziu-se no vocabulário das Misericórdias, mercê de uma política de laicização por um liberalismo anticlerical de 1834, querendo que as Misericórdias se equiparassem a meras instituições laicas, introduzindo-se a designação de Estatuto ou regimento, para estarem nas malhas da burocracia a par de quaisquer outras instituições que o Estado queria controlar; mas as Misericórdias que se prezam e querem ser fiéis à sua vocação e missão de Santas Casas devem procurar na pureza das suas fontes e das suas raízes a força da sua identidade, e optarem por ter, não um mero estatuto, mas um Compromisso que os irmãos, para o serem, assumirão, e se empenharão em respeitar e cumprir, testemunhando-o até como regra pessoal de viver.  

21 - Como e quando foi elaborado o Compromisso?

Por determinação da rainha D. Leonor, com o apoio pessoal e directo de Frei Miguel Contreiras, mas também com o aconselhamento e patrocínio autorizado do Cardeal de Alpedrinha (D. Jorge da Costa), e mandado imprimir, ilustrar e dar à estampa com o melhor e mais requintado cariz artístico pelo rei D. Manuel I, irmão da Rainha, e que sempre apoiou a providencial obra de D. Leonor.

22 - Qual é o genuíno, histórico e tradicional estatuto jurídico das Misericórdias Portuguesas?

O de instituições privadas de solidariedade social empenhadas na prática e no testemunho da caridade cristã, e em tudo quanto sejam modos de intervenção e assistência social, embora com duas vertentes bem especificas, que as tornam numa instituição de "fronteira" e de convergência entre a Igreja e o Estado, merecendo de ambos o estatuto jurídico de, como instituições sociais, serem consideradas "corpo intermediário" complementar e colaborante e de utilidade pública. Estas duas vertentes são explicadas por um lado, sendo Irmandades, no sentido mais histórico e tradicional, com objectivos definidamente religiosos, com templos privativos de sua propriedade, prestação de serviços religiosos e celebração de culto, dispõem de um estatuto canónico, cuja ortodoxia estará confiada à tutela da Igreja, bem como à aprovação do seu compromisso quando revisto e actualizado, para uma garantia de fidelidade de doutrina e disciplina canónica; por outro lado, como instituições de solidariedade social, têm objectivos assistenciais específicos, tocando com a esfera de acção social dependente ou (e) apoiada pelo Estado, reconhecendo-as como tais, verdadeiras instituições de "utilidade pública", de colaboração e complementaridade, à luz dos princípios que regem um sistema de Pacto Social mútuo, concretizado em acordos de cooperação e complementaridade, mas nunca de atropelo, conflitualidade, ingerência e de qualquer intervenção conflituosa que ameace a sua ortodoxia e autonomia.

23 - Que outra característica assinala a autonomia das Misericórdias?

A de que nem uma só Misericórdia, que se saiba, a começar pela de Lisboa, com a Rainha D. Leonor como sua maternal progenitora, foi instituída pela força de dum decreto oficial do Estado, nem por virtude de um despacho canónico da igreja. Foram, sim, em toda a parte, e sempre, iniciativa de cidadãos leigos, no seio e em favor da comunidade, testemunhando, pelo exercício generoso da caridade, a sua fé, até mesmo como forma e expressão do seu indiscutível e indesmentível amor à Pátria, mas vista e sentida na pessoa dos concidadãos mais carenciados. 

24 - Que influência tiveram os soberanos em relação às Misericórdias?

Por um lado, recomendando a sua instituição, sim, mas aconselhando primeiro a que fossem os "Homens Bons" de cada vila e cidade do Reino a tomar a iniciativa da sua instituição, enviando-lhes, quanto muito, emissários com cartas régias sugerindo, mas não impondo, muito embora, e logo desde o início, considerando-as como Irmandades, D. Manuel as declarasse como obras de protecção régia. Por outro lado, abençoou e indulgenciou a hierarquia eclesiástica a sua instituição, como obra especificamente de leigos cristãos comprometidos em Irmandades de bem fazer, prezando-se mesmo muitos Bispos e também muitos sacerdotes de quererem ter a honra de serem contados entre os confrades, e até Mesários e Provedores. É que as Misericórdias, não sendo instituições propriamente clericais, foram, e sempre serão actividade cristã de leigos professos e empenhados no testemunho de uma caridade activa e sempre actuante e segundo expressão de uma eclesialidade sua muito própria.

25 - Que valores culturais se podem equacionar na vocação, mensagem e missão das Misericórdias?

Cinco a saber:

  1. Origem e inspiração cristã, com uma densa carga teológica da mais forte e sublime sociologia, expressa em todo o texto do seu Compromisso;
  2. Sua ordenação em jeito de Irmandade ou Confraria, como única forma associativa congregando os homens da mesma fé, preocupação e missão, qual é a de viverem e cumprirem uma caridade em colectivo, o amor em plural, pois é como irmãos de todos os homens que Cristo manda que nos amemos e nos coloquemos ao seu serviço: em seu Nome.
  3. Omnivalência das 14 obras de Misericórdia, pluriabrangentes de quantas carências se possam suspeitar, para se lhes dar resposta, sob as mais generosas e diversificadas formas de assistência :Mutualismo e Solidariedade, Economia e Promoção Social, Sentido da Vida e mensagem de esperança junto dos que mais precisam;
  4. Autonomia e isenção, mas ao mesmo tempo, respeito e colaboração, sempre numa missão de entendimento e de complementaridade de serviços, função e missão, frente às duas grandes instituições: a) Estado, que sempre respeitou a sua autonomia e as apoiou, mas sem delas se apropriar, exceptuadas apenas algumas situações anómalas; b) Igreja, que sempre as abençoou, mas sem nunca lhes afectar a originalidade de serem obras de leigos apostados em darem testemunho da sua fé na prática organizada do bem, segundo o espírito do evangelho, e que sempre foram beneficiadas com a característica canónica da isenção.
  5. Universalismo e ecumenicidade, uma vez que, tendo como paradigma de comportamento e de acção a figura e o exemplo cativante do Bom Samaritano, não se faz destrinça, nem de credos, nem de religiões, nem de culturas, nem de políticas, nem de longitudes ou latitudes geográficas e sociais, cuidando apenas e só, de se fazer o bem, unicamente porque é bem.  

26 - Segundo a letra e o espírito do Compromisso quais devem ser as características (testemunhas do carácter) principais dos irmãos de uma Irmandade da Misericórdia?

Conforme se determina logo na elaboração do 1.º e histórico Compromisso, embora como a futura adaptação de estilo e linguagem, mas sem alterar o espírito do que é essencial, as qualidades a exigir devem ser estas:

I - Irmãos: Para serem recebidos por Irmãos, os candidatos - além de serem Homens de boa consciência e fama, tementes a Deus, modestos, caritativos e humildes, quais se requerem para servir a Deus e a seus pobres com a perfeição devida, hão-de ter ainda entre outras, algumas condições que se podem expressar deste modo:

- Ser limpo de Sangue;

- Ser Livre de toda a Infâmia;

- Ter idade conveniente;

- Ser de bom entendimento e saber;

- Ter meios que bastem, para não se servir dos bens da irmandade, nem se suspeitar de que poderá aproveitar-se do que lhe correr pelas mãos.

I - Mesários e Provedor:

- Será homem nobre de autoridade;

- Virtuoso de boa forma;

- Muito humilde e paciente pelas desvairadas considerações dos homens com que há-de usar e praticar;

- Repartir entre si todos os cargos segundo o que "mais for serviço de Deus";

- E para os quais cada qual se sentir "mais auto", ou seja apto em condições de melhor servir, os objectivos da Misericórdia;   

27 - Como deve ser feita a admissão de um candidato a Irmão?

Conforme as melhores tradições, e segundo o mais claro espírito da Santa Casa, a admissão do candidato, fazia-se mediante petição - hoje ficha de inscrição - e sobre a qual recaía informação tirada acerca da sua vida, intenções e costumes; e depois de uma votação dos irmãos, só poderia ser aceite aquele que reunisse no seu nome "de 22 Favas brancas para cima".Tenha-se na divida conta que a Confraria desde sempre se sublinhou que deveria ser composta de "Irmãos de boa fama e sã consciência e honesta vida, tementes a Deus e guardadores dos seus mandamentos, mansos e humildosos a todo o serviço de Deus e da dita Confraria".   

Desde quando existe "Misericórdia em Macau"?

Em 1569, o Bispo D. Melchior Carneiro decidiu fundar a confraria de Nossa Senhora da Misericórdia: "Quando cheguei a este Porto , dito do nome de Deus, havia cá poucas habitações de portugueses [...] Mal cheguei, abri um hospital, onde se admitem tanto cristãos como pagãos [...] Criei também uma confraria da Misericórdia para prover a todos os pobres envergonhados e aos que precisem." (Cfr. José Caetano Soares, Macau e a Assistência [Panorama Médico-Social]. Lisboa: Agência Geral das Colónias, 1950, p. 12).